13.9.07


Só por hoje direi que estou de mal com a depressão
e se ela der as caras aplicar-lhe-ei vinte bofetões de alegria.

Só por hoje darei alta aos analistas, psicólogos, psiquiatras,
conselheiros, filósofos e proclamarei que se antes eu era
porque era o que eu era, agora sou o que sou porque sou
tão feliz quanto penso que sou.
Como penso que sou feliz, logo sou.

Só por hoje direi que a vida é uma festa, acreditarei que a
vida é uma festa e farei da festa a minha vida.

Só por hoje admitirei que todo homem nasce feliz, passa
a infância feliz, depois cresce e esconde a felicidade para que
não a roubem, só que daí esquece onde a colocou.
Mas só por hoje lembrarei que estás na minha mente.

Só por hoje rirei à toa e contar-me-ei uma piada tão velha
quanto a história daquele sujeito que olhava por cima do
óculos para não gastar as lentes.

Só por hoje, revelarei ao mundo que sou feliz e chamarei
de absurda toda opinião contrária.

Só por hoje acreditarei que ri melhor quem ri por si mesmo.
Já estou rindo.

Só por hoje informarei a todos que sou tão feliz quanto resolvi ser.

Só por hoje guardarei a seriedade no baú e deixarei que a criança
interior brinque comigo o tempo todo.

Só por hoje estarei tão bem-humorado que rirei
até até daquele anúncio que diz:
"Vende-se uma mala por motivo de viagem."

Só por hoje admitirei que ser feliz é tão
simples quanto dizer que sou feliz.

Só por hoje estarei tão feliz que não sentirei
falta de sentir falta da felicidade.

Só por hoje expulsarei da minha casa a tristeza
e hospedarei a alegria, o sorriso e o bom-humor.

Só por hoje abrigarei a felicidade sob o meu teto,
vesti-la-ei com roupas do bem-estar, dar-lhe-ei a
comida do sorriso, a bebida da alegria e a divertirei
com conversas agradáveis e positivas.

Só por hoje me divorciarei do passado, romperei
o namoro indecoroso com os males do presente
e casarei indissoluvelmente com a felicidade.

Só por hoje hastearei a bandeira do bom-humor
sobre meu próprio território.

Só por hoje decidirei que sou definitivamente FELIZ.

Paulo Trevisan




Tentei dizer quanto te amava, aquela vez, baixinho...
mas havia um grande berreiro, um enorme burburinho
e, pensando bem, o berçário não era o melhor lugar.
Você de fraldas, uma graça, e eu pelado lado a lado,
cada um recém-chegado,
você sem saber ouvir, eu sem saber falar...

Tentei de novo, lembro bem, na escola.
Um PS no bilhete pedindo cola,
interceptado pela professora como um gavião...
Fui parar na sala da diretora e depois na rua,
enquanto você, compreensivelmente, ficou na sua...

A vida é curta, longa é a paixão.

Numa festinha (ah, nossas festinhas...), disse tudo:
"Eu te adoro, te venero, na tua frente fico mudo"
E você não disse nada... E você não disse nada...
Só mais tarde, de ressaca, eu atinei:
Cheio de amor e "Cuba", me enganei
...e disse tudo para uma... almofada!

Gravei, em vinte árvores, quarenta corações.
O teu nome, o meu, flechas e palpitações:
No mal-me-quer, bem-me-quer, dizimei jardins.
Resultado: sou persona pouco grata,
corrido aos gritos de "Mata!! Mata !!"
por conservacionistas, ecólogos e afins...

Recorri, em desespero, ao gesto obsoleto:
"Se não me segurarem, eu faço um soneto !"
E não é que fiz, e até com boas rimas ?!
Você não leu, e nem sequer ficou sabendo....
Continuo inédito e eu, por teu amor sofrendo...

Mas fui premiado num concurso em Minas.
Comecei a escrever com pincel e piche
em muro branco; o asseio, que se lixe;
todo o meu amor para a tua ciência!
Fui preso, aos socos, e fichado.
Dias e mais dias interrogado:
era PC ... PC do B ou alguma dissidência ?

Te escrevi com lágrimas, sangue, suor e mel,
(você devia ver o estado do papel ! ...)
uma carta longa, linda e passional.
De resposta, nem uma cartinha
nem um cartão, nem uma linha!...
Vá se confiar no Correio Nacional !

Com uma serenata sim, uma serenata
como nos tempos da Cabocla Ingrata
me declararia, respeitando a métrica...
Ardor, tenor, a calçada enluarada...
havia tudo sob a tua sacada.
Menos tomada para a guitarra elétrica !...

Decidi, então, botá a maior banca
no céu e escrever com fumaça branca:
"Te amo", assinado...e meu nome bem legível.
Já tinha avião, coragem, brevê,
tudo para impressionar você !
Mas veio a crise: Faltou o combustível !...

Ontem, você me emprestou o seu ouvido
e na discoteca, em meio do alarido,
despejei meu coração...
Falei da devoção há anos entalada
e você disse:" Eu não escuto nada !! "

Curta é a vida, longa é a paixão...

Na velhice, num asilo, lado a lado,
em meio a um silêncio abençoado,
eu lhe direi o que sinto, meu bem...
O meu único medo é que então ,
empinando a orelha com a mão,
você me responda só: "Hein?"

Luiz Fernando Veríssimo


Soneto de Fidelidade

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor :
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Vinicius de Moraes

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